sábado, 7 de maio de 2011

"Coco Chanel - A Revolucionária da Moda"



"Quando, em 1999, a revista americana Time elaborou uma lista das cem personalidades mais marcantes do século XX, constava dela uma mulher cuja vida foi dedicada à moda, ao estilo, à elegância feminina. Coisas demasiado fúteis para lhe valer tal estatuto, poderá pensar-se. Coco Chanel, porém, foi tudo menos fútil. E não se limitou a fazer moda. Através das suas criações inspiradas e arrojadas, «madmoiselle», como a tratavam os colaboradores, fez uma autêntica revolução de mentalidades.

Ao longo da primeira década de 1900, Freud publica A Interpretação dos Sonhos, Marconi faz a primeira radiotransmissão, Einstein formula a teoria da relatividade, o pioneiro da aviação Santos Dumont sobrevoa Paris e Chanel... abre o seu primeiro salão de costura, no nº 21 da Rue Cambon, em Paris. Ali, onde se situa ainda hoje a Casa Chanel, mudará para sempre a forma de vestir das mulheres, libertadas do constrangedor espartilho pouco tempo antes por Paul Poiret.

Um contributo à primeira vista pouco relevante para a Humanidade, argumentar-se-á. Mas inquestionavelmente mais importante do que muitas manifestações sufragistas, contrapomos.

A verdade é que o estilo de vida das mulheres independentes, ativas e trabalhadoras teria sido mais difícil sem esta pioneira que ousou tornar a elegância confortável, permitindo uma liberdade de movimentos antes impensável, e que se tornara tão necessária na hora de dançar o frenético charleston como no momento de entrar e sair dos recém-criados automóveis...

Chanel começou por introduzir no seu próprio guarda-roupa peças então exclusivamente masculinas - algumas do universo desportivo - como as calças, o blaser ou os cardigãs de lã, e a substituir os rígidos modelos cintados e de amplas e incómodas saias compridas que as senhoras da alta sociedade dos séculos anteriores vestiam por modelos fluidos, de cintura descaída e com a perna à mostra. E fez o mesmo com os chapéus, a primeira peça a que se dedicou, reduzindo-os para tamanhos ergonómicos e estilizando-lhes os enfeites. Dizia, aliás, com humor, que os modelos imensos, hiper-ornamentados e pesadíssimos que se usaram nos séculos XVIII e XIX só podiam afetar o cérebro das suas portadoras. Foi ela, também, a primeira a usar o cabelo curto à la garçonne que se tornou imagem de marca dos Loucos Anos 20.

Entre os "atrevimentos" de Chanel que fizeram história e se tornaram obrigatórios conta-se, por exemplo, o vestido preto básico, nascido em 1926 e pensado para ser usado tanto no dia-a-dia como em eventos mais formais, desde que conjugado com os acessórios certos. Num tempo em que para as mulheres o preto era a cor de luto, Coco transformou-o no oposto: na cor das festas!

Defensora de que a moda deve descer das casas de costura e não o contrário, Coco adotava sempre em primeira mão os seus modelos - privilegiando as cores que preferia, o preto, o bege e o branco -, sendo depois seguida pelas mundanas emancipadas e, só muito mais tarde, pelas massas. Não se pense, porém, que a criação visual Chanel dos primeiros anos, com um toque colegial algo andrógina, presidiu o desejo de masculinizar a mulher e retirar-lhe elegância. Pelo contrário, Coco Chanel, que apesar das suas origens humildes, se movimentou na alta sociedade e conviveu de perto com a nata das vanguardas artísticas do seu tempo - entre as amizades contavam-se nomes como Picasso, Cocteau, Stravinsky, Tulouse-Lautrec, Renoir, Mallarmé, Proust ou Colette -, tinha com a elegância, a beleza, a estética e o luxo numa relação privilegiada, intuitiva, feita de equilíbrio e descrição, pois abominava a vulgaridade, a ostentação e o excesso.

Filha de um feirante, Albert Chanel, e de uma costureira, Jeanne Devolle, Gabrielle Bonheur Chanel nasce a 19 de Agosto de 1983, em Saumur, no noroeste de França. A mãe morre e exaustão aos 33 anos, quando ela tem apenas 12 anos, e pouco depois o pai parte para a América, abandonando-a e aos 5 irmãos, aos cuidados de familiares, que rapidamente entregam as raparigas a um orfanato e mandam os rapazes trabalhar numa quinta. Aos 18 anos, Gabrielle é enviada para um convento para aprender costura e, 3 anos depois, entra numa casa de confeção de enxovais.

Pouco interessada em seguir os passos da mãe e ser apenas uma «costureirinha», Gabrielle anda nos 24 anos quando, de visita a um tio, em Vichy, começa a cantar num café-concerto frequentado pelos oficiais pelo regimento local. Pequena, magra e bonita - numa palavra, mignone -, conquista uma legião de admiradores que passa a tratá-la por Coco, em alusão a uma canção que interpreta muitas vezes, Qui qu'a vu Coco dans le Trocadero. Entre eles, Étiene Balsan, um nobre rico que se apaixona por ela e a leva para o seu castelo. O romance durará pouco, mas a amizade perdurará, e Étiene, que a introduz na alta sociedade, aprentá-la-á também ao grande amor da sua vida, o inglês Arthur Capel, conhecido por Boy, com quem Coco manterá uma ligação de 10 anos, que terminará dramaticamente com a morte do empresário e famoso jogador de polo num acidente de automóvel, na véspera de Natal de 1919.

Coco podia ter vivido à custa dos homens ricos e influentes com quem se envolveu, mas essa não era definitivamente a sua ideia de independência. Por isso, nunca se casou, e, mesmo não rejeitando o incentivo e apoio monetário de alguns desses homens, nomeadamente de Capel, que financiou a sua primeira loja de chapéus, nunca deixou de trabalhar arduamente. E com talento, dedicação e uma vontade férrea, a menina humilde de Saumur acabou por ser, de facto, muito mais do que uma «costureirinha».

«A moda tem que ver com ideias, com a forma como vivemos, com o que está a acontecer», disse Chanel um dia. Ela própria acabou por ter a noção de que, mais do que ornamentar os corpos femininos, estava a transformar a moda numa filosofia de vida. Porque teve a capacidade visionária de antecipar o que o mundo em vertiginosa evolução ia exigir às mulheres. Em troca, elas permitiram-lhe construir um verdadeiro império. Que seria temporariamente ameaçado pelos sonhos imperialistas de Hitler, pois em 1939, sem matérias-primas nem clientela, Chanel dispensa todo o pessoal e encerra o salão. Mas não deixa Paris. Instala-se numa suite do Hotel Ritz (passará aí os últimos anos de vida) e envolve-se com um oficial das SS, Hans von Dincklage, que a apoia na tentativa de aproveitar o anti-semitismo do momento para tentar recuperar a totalidade dos direitos do seu famoso e mundialmente vendido Chanel Nº 5 - o perfume que Marilyn Monroe «vestia» para dormir -, concebido em 21 pelo seu «nez», Ernst Beau, mas produzido e comercializado, desde 24, por dois irmãos judeus que tinham 80 por cento dos direitos, Pierre e Paul Wertheimer (sócios da empresa de cosméticos Bourjois e cujos descendentes possuem hoje a totalidade da casa Chanel).

No pós-guerra, valeu-lhe a intervenção do seu amigo Winston Churchill para não sofrer consequências mais pesadas, mas viu-se obrigada a exilar-se na Suíça até 54. De regresso a Paris, por pressão dos Wertheimer, que tinham recuperado todo o seu património, mostra, aos 71 anos, que a sua criatividade continua em forma, concebendo o famoso tailleur em tweed, com quatro bolsos de chapa e botões jóia, que deveria usar-se com um camiseiro de ceda e dois outros must Chanel: o scarpin de duas cores e a mala acolchoada com corrente dourada. A versão ultra feminina, elegantíssima, do fato de homem, ideal para o novo papel que as mulheres começavam a desempenhar: o de executivas.

Nos anos 60, porém, Madmoiselle será confrontada com um fenómeno que a horroriza: o visual flower power, que nasce nas ruas, pela mão dos hippies, e influencia o que se faz nas casas de costura. Chanel detesta tudo no visual dos jovens desta época, dos cabelos compridos dos hippies às minissaias criadas por Mary Quant, e recusa-se a aderir. Aos 87 anos, e já incapaz de acompanhar os ares do tempo, vai-se fechando em si própria e morre isolada a 10 de Janeiro de 1971.


Ana Paula Homem."

Fonte: Caras (07 de Maio de 2011)

2 comments:

Fiquei a adora-la desde que vi o filme. Sem dúvida um exemplo!

(comentário recuperado de 10 de Maio de 2011)

também passei a admirá-la desde vi o filme. Soube da existência do filme através da Wiki mas o que lá tem sobre ela não é tanto como o que é mostrado no filme. será, aliás, o próximo filme a surgir no blog mesmo sem interesse dentro dos "filmes que me marcaram", já em preparação... há algo de muito corajoso nesta Coco

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