segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

pénis, o símbolo de superioridade para os machos

« Persuadem a criança de que é por causa da superioridade dos meninos que exigem mais dela; para encorajá-la no caminho difícil que é o seu, insuflam-lhe o orgulho da virilidade; essa noção abstrata reveste para êle um especto concreto: encarna-se no pênis; não é espontaneamente que sente orgulho do seu pequeno sexo indolente; sente-o através da atitude dos que o cercam. Mães e amas prepetuam a tradição que assimila o falo à ideia de macho; seja porque lhe reconhecem o prestígio na gratidão amorosa ou na submissão, seja porque constitua para elas um revide reencontrá-lo sob uma forma humilhada, o fato é que tratam o pênis infantil com uma complacência singular. Rabelais diz-nos dos folguedos das amas de Gargântua (1); a história registou os das amas de Luís XIII. Mulheres menos impudentes dão entretanto um apelido gentil ao sexo masculino a falam-lhe dele como de uma pequena pessoa que é a um tempo ele próprio e um outro; fazem desse sexo, segundo a expressão já citada, "um alter ego geralmente mais esperto, mais inteligente e mais hábil do que o indivíduo". Anatomicamente, o pénis presta-se muito bem a esse papel; separado do corpo, apresenta-se como um pequeno brinquedo natural, uma espécie de boneca. Valorizam portanto a criança valorizando-lhe o duplo. Um pai contava-me que um de seus filhos com a idade de três anos ainda urinava sentado; um dia o pai levou-o ao W. C. dizendo-lhe: "vou te mostrar como fazem os homens". A partir de então o menino, orgulhoso de urinar em pé, desprezou as meninas "que mijam por um buraco"; [...]


Assim, longe de o pênis ser descoberto como um privilégio imediato de que o menino tiraria um sentimento de superioridade, sua valorização surge ao contrário como uma compensação inventada pelos adultos e ardosamente aceita pela criança. [...] Posteriormente, o menino encarnará em seu sexo sua transcendência e sua soberania orgulhosa.

A sorte da menina é muito diferente. Nem mães nem amas têm reverência e ternura por suas partes genitais; não chamam a atenção para esse órgão secreto de que só se vêo invólucro e não se deixa pegar; em certo sentido, a menina não tem sexo. Não sente essa ausência como uma falha; seu corpo é evidentemente uma plenitude para ela. mas ela se acha situada no mundo de um modo diferente do menino e um conjunto de fatores pode transformar a seus olhos a diferença em inferioridade ».

(1) "... E já começava a exercitar a piroca que todos os dias suas governantas enfeitavam com lindos ramalhetes, fitas bonitas, belas flores, vistosas borlas, passando o tempo a alisa-lo como se fosse um tudo de ungüento e arrebentando de rir quando ela endurecia, como se a brincadeira lhes agradasse. Uma a chamava de meu batoquinho, outra de meu pinhão, outra de meu tronco de coral, outra de meu tampão, minha rolha, minha varinha, meu boticão, minha verruga, meu penduricalho, etc..." (tradução de Aristides Lobo).

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Conforme o original: "O Segundo Sexo - A Experiência Vivida" de Simone de Beauvoir, Difusão Européia do Livro, São Paulo - Brasil, Segunda Edição, 1967, Tradução de Sérgio Milliet.

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